top of page

A LÍNGUA DA AUTORIDADE: margem reflexiva para compreender a invenção da autoridade na ciência

Tendo em vista as visões bourdieusiana e wilsoniana sob o prisma da linguagem, percebemos como a construção da autoridade perpassa um conjunto de mecanismos e ferramentas tecidos e potencializados através de fundamentos linguísticos. Bordieu (2013) alerta-nos que o homo academicus constrói-se a partir de uma cientificidade socialmente reconhecida, ou seja, não é a verdade que sustenta o discurso científico do “retor pesquisador”, mas a crença em sua verdade. Assim, “[...] na luta das representações, a representação socialmente reconhecida como científica, isto é, como verdadeira, contém uma força social própria e, quando se trata do mundo social, a ciência dá ao que a detém, ou que aparenta detê-la, o monopólio do ponto de vista legítimo, da previsão autoverificadora.” (BOURDIEU, 2013, p. 53)

No pensamento de Bordieu (2008) orientado para uma “economia das trocas linguísticas”, o teórico francês demonstra que a construção de uma determinada figuração do indivíduo perpassa a noção de “gramaticalidade” a partir da “aceitabilidade”, colocada a partir da apresentação de uma “língua legítima”. Esta construção comporta ainda a tessitura das relações de comunicação (também chamadas pelo autor de “interações simbólicas”) a partir de relações de força simbólica, onde o sentido do discurso está dado a partir do valor e do poder de tal discurso. Por fim, a invenção do “poder” do sujeito depende de uma competência linguística relativa ao capital simbólico, presente no locutor no âmbito de sua estrutura social (no caso do homo academicus, no seio de sua comunidade científica).

Assim, a “autoridade cognitiva” wilsoniana só se estabelece, no meio científico, por um viés linguístico-simbólico-bourdieusiano: a linguagem, como práxis, responde pela competência ou pela incompetência daquele que se coloca como legítimo retor para determinado tópico (teoria, metodologia, etc.). O domínio da gramática passa, pois, pelo domínio das condições de figuração e de circulação das regras de uma dada gramaticalidade. Bourdieu (2008) afirma que para se constituir uma ciência rigorosa da linguagem, a linguística, por exemplo, deveria questionar não as condições de intelecção da língua, mas a questão das condições sociais de possibilidade da produção linguística.

A reflexão bourdieusiana permite uma perspectiva analítica do “poder cognitivo” em Wilson que encontra a pragmática informacional na Ciência da Informação, aproximando-se de análises realizadas por González de Gómez (1996, 2006). Trata-se de perceber o enfoque pragmático (nos termos de Rendón Rojas (1996)), como uma via de apreensão da realidade sócio informacional. Neste enfoque, a linguagem se coloca como principal elemento de fundamentação das relações (não apenas como ferramenta, mas como potencialidade reflexiva). O desdobramento, para o diálogo da reflexão sobre autoridade entre Bourdieu e Wilson, é a consequente vinculação das relações de poder epistêmico à competência linguística – em termos capurrianos, diríamos, “competência hermenêutico-retórica”. (CAPURRO, 1992).

De um lado, encontramos em Wilson a possibilidade de compreensão pontual, no âmbito informacional, da manifestação material-linguística da autoridade dada a partir do caráter cognitivo. Através de indivíduos e seus livros, organizações, instituições, esta autoridade é constituída. A crítica bourdieusiana permite o aprofundamento das relações simbólicas da condição da linguagem como “força” de construção ou de destituição de uma “autoridade epistêmica”. Aqui, um conjunto de mecanismos oriundos do poder simbólico estabelecem a determinação de quem pode falar, de como poder se manifestar, de quando e de onde pode se apresentar. Tais mecanismos são as estratégias de invenção da autoridade, estruturadas em uma relação de autoridade-crença.

Pelo viés bourdieusiano, compreendemos que a relação de comunicação (incluindo a aquela dita “científica”) é uma pressuposição da autoridade (componente da interação, segundo a proposição das condições sociais da linguagem). A “liturgia” da ciência se estabelece, pois, de acordo com mecanismos simbólicos que permitem distinguir os autorizados de fala dos não autorizados.

Elementos retóricos, pois, como conquistar o público, argumentar, seduzir, convencer, estão vinculados a um conjunto de pressupostos sócio históricos. O convite às perspectivas de Bourdieu e Wilson sobre a autoridade remonta, pois, no discurso informacional, as relações entre linguagem, pragmática e o simbólico, conforme as análises de Rendón Rojas (1996), Capurro (1992) e González de Gómez (2006).

Algumas fontes

BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.

BOURDIEU, Pierre. O campo científico. In: ORTIZ, Renato (Org.). Pierre Bordieu: sociologia. São Paulo: Ática, 1983. Cap. 4.

BOURDIEU, P. Homo academicus. Florianópolis: ed. da UFSC, 2013.

BOURDIEU, P. A Economia das trocas linguísticas: o que falar quer dizer. 2. ed. São Paulo: Edusp, 2008.

GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. Novas configurações do conhecimento e da validade da informação. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 8, 2007, Salvador. Anais... Salvador: UFBA/PPGCI; Ancib, 2007. Disponível em: <http://www.enancib.ppgci.ufba.br/> Acesso em: 8 fev. 2010.

JAPIASSU, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. 4. ed. atual. Rio de Janeiro: Zahar, 2015.

WILSON, Patrick. Second-Hand Knowledge: and inquiry into cognitive authority. Westport, USA: Greenwood Press, 1983.

Posts Em Destaque
Posts Recentes
Arquivo
Procurar por tags
  • Facebook Basic Square
  • Twitter Basic Square
  • Google+ Basic Square
Siga
bottom of page