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Bibliologia, Documento e a nova técnica cultural da documentação em Briet

O desenvolvimento teórico da noção de documento na Bibliologia nos permite um método para conhecer o mundo: só existe a terceira margem do antílope na tradição da organização dos saberes, ou seja, não temos o seu interior ou sua forma.

O que temos é a viscosa camada discursiva que cobre a noção de antílope, camada esta desdobrada no doble documental dos “espíritos” que é desenvolvido pelas práticas de organização dos saberes. Briet (1951) não deixa de considerar o “antílope” ainda em seu habitat como um documento: ele é, sim, o documento inicial. Mas o é no seu processo de transferência. Não pode sê-lo, na visão brietiana, antes.

A “nova técnica cultural da documentação” cria, segundo Briet (1951), uma instituição cultural para os cientistas: os centros de documentação. São estes centros “indústrias de indexicalidade” que representam a “economia do simbólico” no campo científico – resumindo, classificando, comentado, entrecruzando, produzindo, segundo a Madame Documentation, traduções, análises, boletins, arquivos, catálogos, bibliografias, fotografias, resumos, como se dava (agora os dados tecnológicos posteriores) nas bibliotecas antigas e medievais, os saberes dispersos entre as palavras e as coisas.

Para esta explicação, Frohmann (2009) recorre à metáfora da linguagem em Wittgenstein (1979): os fenômenos designados pelas palavras representam o desenho de um texto familiar (de discursos construídos a partir de semelhanças de família) que está disperso em um fio frágil de uma corda que se torna cada vez mais “sólida” – diríamos “material” –, compondo uma sobreposição de discursos que resultam em uma corda robusta.

É aqui que, acreditamos, o “neodocumentalismo” nos apresenta o seu neo, afastando-se do documentalismo da “prova”, da “verdade”, ou seja, do positivismo otlet-brietiano. A visão wittgensteiniana, revela Frohmann (2009), coloca o conceito de “evidência” sem força argumentativa. A metáfora é apropriada na visão frohmanniana para a tentativa de explicação de como o mundo documental está presente nas construções discursivas do homem e se interpenetram na própria definição destes discursos.

O que é um documento, afinal, pergunta-se, enfim, Frohmann (2009, p. 301) “is more like seeding rhizomes than growing a tree”. A resposta, deleuziana, é também wittgensteiniana: a realidade como este discurso que vai, aos poucos, multiplicando-se indefinidamente sem origem, sem presente, sempre por crescer.

Algumas fontes

BRIET, S. Qu'est-ce que la documentation? Paris: Éditions Documentaires Industrielles et Técnicas, 1951. BUCKLAND, M. Information as thing. Journal of the American Society of Information Science, v. 42, n. 5, p. 351-360, jun. 1991. CAPURRO, R.; HJORLAND, B. The concept of information. Annual Review of Information Science and Technology, v. 37, p. 343-411, 2003. ESTIVALS, R. A dialética contraditória e complementar do escrito e do documento. R. Esc. Bibliotecon. UFMG, Belo Horizonte, v. 10, n. 2, p. 121-152, set. 1981. FOUCAULT, M. et. al. Estruturalismo e teoria da linguagem. Petrópolis: Vozes, 1971. FROHMANN, B. Documentation redux: prolegomenon to (another) philosophy of information. Library Trends, v. 52, n. 3, p. 387-407, win. 2004. FROHMANN, B. Revisiting “what is a document?” Journal of documentation, v. 65, n. 2, p. 291-303, 2009. FROHMANN, B. Reference, representation, and the materiality of documents. In: Colóquio científico internacional da Rede MUSSI Mediações e hibridações: construção social dos saberes e da informação. Anais... 2011. Toulouse: Université de Toulouse 3, 2011. JACOB, C. Prefácio. In: BARATIN, M.; JACOB, C. O poder das bibliotecas: a memória dos livros no Ocidente. Rio de Janeiro: ed. UFRJ, 2008. p. 9-17. LUND, N.W. Document Theory. ARIST, v. 43, n.1, p. 1-55, 2009. LUND, N.W. Document, text and medium: concepts, theories and disciplines. Journal of Documentation, v. 66, n. 5, p. 734-749, 2010. OTLET, P. Traité de documenatation: le livre sur le livre: théorie et pratique. Bruxelas: Editiones Mundaneum, 1934. RANGANATHAN, S.R. As cinco leis da Biblioteconomia. Brasília: Briquet de Lemos, 2009.

SALDANHA, G. O fabuloso antílope de Suzanne Briet: a análise e a crítica da análise neodocumentalista. In: XIII ENANCIB - Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação, 2012, Rio de Janeiro. Anais do XIII ENANCIB - Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2012. v. 1. WITTGENSTEIN, L. O livro azul. Lisboa: Ed.70, 1992. WITTGENSTEIN, L. Investigações Filosóficas. 2o ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

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