Biobibliografias: uma engenharia informacional?
O termo biobibliografia tenta reunir sob um único conceito um conjunto de documentos e/ou partes de documentos existentes no horizonte bibliográfico ao longo da história. Este conjunto se manifesta com diversos nomes: biobibliografias, dicionários biográficos, dicionários biobibliográficos, Who's Who entre outros. A noção biobibliográfica reúne estes artefatos discursivos sob um mesmo formato, o que nos permite estudá-los de forma conjunta.
Biobiliografias são fontes de informação que se constroem com o objetivo de reunir informações biográficas e bibliográficas acerca de uma comunidade. Um conceito simples, que se materializa em artefatos totalmente voltados a este fim, ou diluídos em documentos ou escritos com outra intenção. O "Quem é quem na Biblioteconomia e Documentação no Brasil" (IBBD, 1971), ou ainda o "Dicionário Biobibliográfico de historiadores, geógrafos e antropólogos brasileiros" (IHGB, 1991) são exemplos de fontes de informação biobibliográficas voltadas especialmente para a comunicação biobibliográfica. Os dois exemplos se assentam no campo científico, mas temos biobibliografias em diversos campos, como na literatura, nas artes e nas lutas sociais. No entanto, podemos pensar em outros documentos que diluem, em seu conteúdo, informações biobiliográficas, a apresentação de um autor na "orelha" do livro geralmente traz um histórico biográfico e cita outras obras do autor, podemos pensar essas informações como biobibliográficas.
A historicidade da construção, usos e efeitos deste tipo de fonte é interessante por natureza. Há um protagonismo latente de bibliógrafos, documentalistas, bibliotecários e arquivistas declarado em muitas destas fontes. Atualmente, na prática informacional digital em rede, esta historicidade escoa para sistemas de informação como o Currículo Lattes e o Orcid (no campo científico-acadêmico), mas também em sites e páginas pessoais (em demais campos sociais). Como objetos construídos para representar os sujeitos e reunidos materialmente seja num dicionário biobibliográfico impresso, numa plataforma ou em uma rede social digital, esta materialidade está coberta de vícios sociais, se aconchega em uma estrutura social, trabalha para formação discursiva baseada num discurso "ser-saber" que intencionalmente formata, através de uma linguagem pragmática, os sujeitos, e por consequência um campo, uma comunidade.
Sendo a biobibliográfica identificada numa realidade informacional, cabe aos estudos da informação e dos saberes questionar-se sobre os discursos, os efeitos, os cortes, as exclusões, as relações sociais, as dominações, e por fim as realidades e as verdades que constroem e são construídas por biobibliografias. Uma arqueologia ordenada, uma genealogia caótica.
Bibliografia sugerida:
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2011.
BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. 2. ed. Porto Alegre: Zouk; São Paulo: EDUSP, 2011.
CUNHA, Murílo Bastos da; CAVALCANTI, Cordélia Robalinho de Oliveira. Dicionário de Biblioteconomia e Arquivologia. Brasília, DF: Briquet de Lemos, 2008.
FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
FOUCAULT, MIchel. A ordem do discurso. São Paulo: Edições Loyola, 1996.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 22ª Ed. Rio de Janeiro: Graal, 2006.
FROHMANN, Bernd. A documentação rediviva: prolegômenos a uma (outra) filosofia da informação. Revista Morpheus, Rio de Janeiro, v. 8, n. 14, p. 227-249, 2012.
INSTITUTO BRASILEIRO DE BIBLIOGRAFIA E DOCUMENTAÇÃO. Quem é quem na biblioteconomia e documentação no Brasil. Rio de Janeiro: IBBD, 1971.
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO. Dicionário biobibliográfico de historiadores, geógrafos e antropólogos brasileiros. Rio de Janeiro: IHGB, 1991.