O ESPECTRO TURVO DE UM NOME: do conceito de informação entre a linguagem e o símbolo
A diversidade de conceitos sobre informação requer um esforço conceitual a fim de buscar uma definição que sirva aos propósitos da investigação, pois o que a pesquisa propõe é exatamente uma aproximação entre informação, linguagem e símbolo, em uma perspectiva filosófica cujo maior problema é relacionar informação com linguagem e símbolo em uma perspectiva dialógica entre as concepções idealista e realista.
No aspecto filosófico, a Ciência da Informação responde, enquanto ciência hermenêutico-retórica, cujo objeto de estudo é a linguagem-símbolo (ou informação simbólica), pelos argumentos de Rafael Capurro, numa abordagem representacionista (homem informacional), se aproximando de Ernst Cassirer (homem simbólico), o que possibilita o deslocando da centralidade dos estudos informacionais para o homem.
Em primeiro lugar, faz-se necessário mais relevantes de informação no escopo da Ciência da Informação produzidos, em geral, em uma tentativa que ora se aproxima ora se distancia da pesquisa para buscar uma compreensão do conceito e sua aplicação. A teoria passa por Zeman (1970), Belkin (1978), Farradane (1955; 1979), Brookes (1980), Buckland (1991; 1999), Rayward (1996; 1997), Eugenio, França e Perez (1996), Bates (1999), Hjørland (2000a; 2000b), Wilden (2001), Floridi (2002; 2008) e, finalmente, chega à Capurro (1985, 1991), o principal aporte teórico para o desenvolvimento de uma abordagem filosófica para a CI.
Conforme disse Einstein a Heisenberg, “ver ou não uma determinada coisa depende da teoria que utilizamos”, sendo a “teoria que decide o que pode ser observado” (apud ILHARCO, 2003, p.45), uma “não definição” de informação aceita universalmente faz com que muitos caminhos possíveis possam ser tomados quando olhamos para a informação enquanto objeto científico.
De acordo com Zeman (1970, p. 156), a informação, por uma abordagem filosófica idealista, seria algo criado e ativado pelo pensamento. Por outro lado, em uma abordagem materialista, haveria, por meio de uma prática social, a união entre sujeito e objeto, o que resolveria uma contradição entre ideia e realidade pelo ato. Para o autor, informação é “qualidade da realidade material a ser organizada” (qualidade de conservar esse estado organizado) e “sua capacidade de organizar, de classificar em sistema, de criar” (capacidade de desenvolver organização).
No escopo da CI, a partir de uma leitura de Belkin (1978), destaca-se o conceito de informação como: uma espécie de descritor de interações não físicas entre humanos, máquinas e “universos”; um descritor para o conhecimento; um aspecto da comunicação; uma estrutura que resulta da organização de dados e de experiências, ou ainda, uma estruturação de signos, mensagens ou textos organizados com a intenção de afetar a estrutura cognitiva de quem recebe.
Na concepção de Farradane (1955; 1979), personagem central na construção da CI, enquanto nova disciplina científica, nos anos 1950, informação seria uma forma física de representação do conhecimento ou pensamento usada com finalidade comunicacional. Para que essa representação tenha sentido, é necessário, segundo esse autor, que haja relação entre quem produz e quem é afetado pela informação representada. Assim, a representação da informação necessita estar conectada aos fenômenos mentais do indivíduo e deve constituir-se de uma comunicação intencional.
Brookes (1980), pesquisador caracterizado como grande nome da chamada corrente “cognitivista” dos estudos informacionais, ao lado de Belkin (1978), por sua vez, define informação como um conteúdo intelectual, existente apenas no âmbito cognitivo ou mental que apenas pode ser acessível a nós como linguagem. Ainda para ele, a informação representa um elemento para incremento de conhecimento - um novo estado de conhecimento é alcançado quando um novo conhecimento, adquirido por meio de um suplemento de informação, é acrescentado ao estado de conhecimento pré-existente.
Qualquer coisa é ou deve ser informativa e tudo é ou deve ser informação, conforme Buckland (1991; 1999), autor mais próximo de uma corrente crítico-material (e não materialista) dos estudos informacionais. Entretanto, uma definição presente em Bates (1999) define informação como uma entidade que equivale à energia e radiação que envolve a todos. Nesse sentido, a informação necessita de aparelhos que passam a captá-la em uma determinada frequência ou os sentidos de todos devem estar preparados para reconhecê-la. Segundo ele, a informação deve ser considerada apenas por conta de sua relação com o conhecimento. Sendo esta derivada do conhecimento, poderia ser considerada como um processo capaz de informar, comunicar e, por sua vez, reduzir incertezas. Conceito também presente em Eugênio, França e Perez (1996).
Rayward (1996; 1997) recuperando Mackey (1950) define informação como “quase tudo”, uma vez que a história do universo é a própria história do processamento da informação, assim como, em um contexto social, a história humana também. Para o autor, informação seria tudo aquilo que é apreendido ou dito; ou seja, inteligência, notícia etc.
Na virada do século, Hjørland (2000a; 2000b) afirmou que informação não é uma ‘coisa’, mas que coisas podem ser consideradas como informação. O conceito de informação, para ele, possui ambiguidade, podendo ser uma forma substituta do termo documento, assim como uma unidade intangível ou dados em potencial capazes de serem processadas e gerenciadas por um sistema de informação.
De acordo com Wilden (2001, p. 11), um teórico social britânico, a informação tem dois sentidos: um clássico, ou métrico, como quantidade; e um outro pertencente a uma abordagem diversa e qualitativa; “a organização da própria variedade”. Para ele, “a informação biológica, tal como a informação social, é caracterizada invariavelmente por distinções qualitativas, de níveis e tipos de variedade e ordem” (WILDEN, 2001, p. 26).
Enquanto a “abordagem métrica ocupa-se, sobretudo, com uma única e limitada forma de valor de troca na comunicação”; a outra, a abordagem qualitativa, “interessa-se por vários níveis e tipos de e tipos de valores de troca” (e.g., o simbólico) e “também pelo problema muito mais complexo dos valores de uso na comunicação” (WILDEN, 2001, p. 12), ou seja, informação para que finalidade e para quem.
Para Wilden, “o conceito de informação faculta um instrumento para explicar por que razões é o contexto necessário ao significado” (WILDEN, 2001, p.15). Segundo ele, “sem contexto não pode haver informação”, uma vez que a “informação só pode nascer no âmbito do contexto de sistemas finalizados, também contextualizados por ordem de complexidade”.
No âmbito da filosofia da informação contemporânea, Floridi (2002) define informação, em um sentido técnico forte, como conjunto de dados bem formados e significativos e, num sentido técnico fraco, como agrupamento de dados registrados ou documentos. Para ele, a informação pode configurar-se como algo que pode ser dito, ou seja, ter um caráter factual, mas também ser um fenômeno relacional, um processo capaz de dar forma a algo que possa ser identificado ou compreendido e, ainda, um elemento que substitui a coisa que ela representa, ou seja, dados, fatos, eventos ou conhecimento das coisas.
Por ser um ‘elemento' capaz de direcionar as ações humanas, a informação não é um fenômeno neutro e muito menos circunscrito apenas aos círculos acadêmicos e científicos. Em uma perspectiva apontada por Capurro e Hjørland (2007, p. 193), é fácil perder a orientação quando se estuda informação. Afinal, muitas são as possibilidades de descrever o fenômeno informacional e muitos são os conceitos inseridos em estruturas teóricas mais ou menos explicitas, o que impõem a necessidade de uma análise distanciada, porém ampla da informação e da CI, enquanto campo de estudo dos fenômenos informacionais.
Uma vez que a noção de informação, na perspectiva de Capurro (1991, p. 3), assume na CI uma relação com o homem, essa relação explícita com a esfera humana impõe a observação de certos pressupostos ontológicos relevantes para a fundamentação filosófica da CI, sugerindo a importância de uma reflexão filosófica a respeito do campo de estudos que a ela se ocupa.
Algumas fontes
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BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
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BROOKES, B. C. The foundation of Information Science. Part I: Philosophical aspects. Journal of Information Science, v. 2, p. 125-133, 1980.
BUCKLAND, M. K. Information as thing. Journal of the American Society for Information Science, New York, v.45, n.5, p. 351-360, 1991.
CAPURRO, R. Epistemology and information science. Lecture given at the Royal Institute of Technology Library Stockholm, Sweden. REPORT TRITA-LIB-6023. 1985. Hermeneutics and Information. Disponível em: <http://www.capurro.de/trita.htm#III>. Acesso em 12 Dez. 2014.
CAPURRO, R. Foundations of information science: review and perspectives. In: INTERNATIONAL
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CASSIRER, E. Ensaio sobre o Homem: Introdução a uma Filosofia da CulturaHumana.Tradução de Tomás Rosa Bueno. São Paulo: Martins Fontes, 2012.
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McLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação: como extensões do homem. Editora Cultrix,1974.
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